Arquivo da tag: #guloseimas

Se essa rua fosse minha…

Quanto vale uma rua em São Paulo? Walter Mancini, senhor absoluto de uma

Localize-se

Localize-se

ruazinha no centro da cidade, sabe a resposta. Dono de 5 restaurantes e de uma galeria de artes na Avanhandava, ele foi responsável por toda a reforma da rua, da troca do asfalto às luzes que dão um ar europeu ao lugar.

Em cada um de seus restaurantes, uma peculiaridade: enquanto a tradicional Famiglia Mancini conserva a aparência das tradicionais cantinas italianas, o Walter Mancini Ristoranti encanta com o seu tom sofisticado e com um bar de dar inveja a qualquer outro estabelecimento. Há ainda a Pizzaria Famiglia Mancini, sempre com suas filas enormes, o Jeremias, O Bar, inspirado no personagem de Ziraldo e com quadrinhos por toda a parede e a Central 22, que vai além das lanchonetes convencionais, complementando a diversidade gastronômica da rua Avanhandava.

Mas se você ficou com água na boca, um aviso: prepare o bolso. Todas essas delícias culinárias em ambientes incríveis não vão sair por menos de R$ 100,00 – fora couvert, estacionamento e etc, afinal não nos esqueçamos que ainda estamos no centro da cidade, em uma das regiões mais perigosas de São Paulo.

Mas não na rua dos Mancini, que parece ter construído seu cantinho de paraíso, para a sorte e, aos mesmo tempo, pesar dos moradores da ruazinha: “Eles trazem beleza e segurança pra cá, mas é como se eu morasse de favor no meu apartamento, não tenho direito nem de estacionar o carro”, relembra Maria da Penha, moradora de um prédio no final da Avanhandava.

Entre os prós e contras, o fato é que Walter Mancini criou uma rua à parte de todo o centro, transformando-a em mais do que uma referência gastronômica, um ponto turístico.

E sinceramente, vale a pena conferir. 😉

1 comentário

Arquivado em Centro de São Paulo

O Mercado Municipal, de outro ângulo

O Mercado Municipal em um dia de semana

O Mercado Municipal aparece muito na imprensa. Entre sanduíches de mortadela e pastéis de bacalhau, o prédio imponente que abriga e, ao mesmo tempo, isola os produtos sortidos do mercado do resto da cidade de São Paulo tornou-se símbolo da variedade comercial paulista. Acima de tudo, o Mercadão traduz um sentimento de tradição e fartura que é igualado por muito poucos outros centros comerciais no Brasil. Até mesmo os comerciantes sentem o impacto de estar em um tão variado centro gastronômico.
Fundado em 1933, o Mercado Muncipal foi inaugurado já do jeito que é conhecido até hoje: com seus mais de doze mil e seiscentos metros quadrados, arcos imponentes e movimento mercantil inigualável. O ano de 2008 marca em especial uma conquista para os comerciantes do Mercado: há exatos setenta e cinco anos, nascia pelas mãos da prefeitura de São Paulo o primeiro mercado público da cidade. E desde então ninguém conseguiu se afastar do tal palácio.
Sérgio Gonçalves Pacheco, 81, comercia dentro das paredes do estabelecimento desde 1945. Ele, mais do que ninguém, pode mostrar como se desenvolveu o Mercado Municipal. Sua atual banca é herança do pai, Clemente Pacheco, que esteve presente durante a inauguração, às margens do rio Tietê. O comércio fluvial era a vantagem da época, lembra. Em 1944, quando o pai faleceu, Sérgio recebeu com seus irmãos os direitos sobre a pequena mercearia que gere até hoje.
Que ninguém se deixe enganar pelo tamanho, no entanto: a lojinha é um dos grandes destaques de variedade do Mercadão. Queijos, vinhos, temperos dos mais variados, produtos frescos e condimentos imperecíveis, tudo está na banca do Pacheco. Desde que o pai veio para o estabelecimento, depois que a prefeitura completou o projeto de sete anos do Mercado Municipal de hoje, a mercearia de Pacheco presenciou todo tipo de situação incomum e adversa, como a grande falta de produtos suínos nos anos 70, mas a história de sucesso da família veio do longínquo ano de 1912. Na época, Clemente Pacheco comprou uma pequena vaga no então Mercado Municipal, conhecido como Mercado dos Caipiras, e conduziu os negócios até a mudança. O alvará de Pacheco, manchado pelo tempo e por uma ou duas manchas de gordura, comprova o que o homem fez, em português arcaico.
Nem tudo é cor-de-rosa, no entanto. Sérgio faz sempre questão de comentar com saudosismo a época de ouro do comércio local do estabelecimento. “O Mercado sempre foi movimentado, mas melhoraram o mercado, pintaram, reformaram, e agora o pessoal vem aqui ver”, ele reclama, referindo-se à falta de interesse pelos produtos.
Sérgio, contudo, é um velho comerciante que está para se aposentar. Não surpreendente, está encaminhando o projeto para as três filhas, e diz que o problema das vendas é agora da próxima geração. Ele agora pensa em descansar e, quando der na telha, visitar o Mercadão para um passeio.

Sérgio Golçalves Pacheco, 81, em sua loja de sortidos.

Andando para o lado menos charmoso do Mercado, aquele das carnes e produtos crus, a geração que entra para trabalhar como comerciante não pode dizer o mesmo. Luciana Gomes, 38, é uma dos muitos que receberam a incumbência de continuar os negócios da família. Na gerência da Distribuidora de carnes Cantareira, a vendedora divide o tempo entre o açougue que lidera e a vida familiar. Sua loja é antiga: tem 40 anos de existência, e, como no caso de Sérgio, era do pai, Luiz Rui Gomes.

Ao morrer, o pai igualmente deixou uma parte de seu legado mercantil para cada filho, mas a esposa vendeu o estabelecimento para um concorrente da época. Foi com muito esforço que Luciana eventualmente recomprou o espaço para comerciar no Mercado, e assim adquiriu uma vasta experiência na vida do comerciante do local.
O que ela revela lembra muito do que disse Sérgio: o Mercado mudou muito, sem dúvida. Sua origem cerealista foi substituída pelo turismo, inflado principalmente pela prefeitura.
O grande segundo andar construído pela prefeitura em madeira para dar um ar cênico à experiência, comprova o que diz Luciana. Ela gosta de citar particularmente o caso do abastecimento por caminhões, que, ao contrário do passado, não podem mais parar nas redondezas durante o dia, e têm que descarregam o produto para as vendas às quatro e meia da manhã.
“A venda tradicional caiu muito”, confessou. Ela explicou que, para a grande maioria dos comerciantes, o Mercado simplesmente não tem mais infra-estrutura suficiente para comportar a demanda da cidade. O estacionamento (e ela frisa: sempre o estacionamento) é a maior das brigas com a prefeitura. Por mais de trinta anos, a Associação da Renovação do Mercado Paulistano (RENOME) discutiu constante com o prefeito para expandir a área disponível para os carros dos consumidores. Não deu em nada. Segundo Luciana, a questão já foi tão procrastinada que existem algumas famílias transferindo a responsabilidade da reforma para a terceira geração, depois de mais de tantos anos de demora.
Outros assuntos surgem no quesito “reforma” quando questionada: “É normal passar o ‘box’ de geração em geração”, ela diz, explicando que o cuidado com o Mercado é uma coisa dos comerciantes. “Antes, o mercado municipal era feinho, era um mercado de quantidade”, ela continua, “não tinha vigilância sanitária, e quando ela aparecia era uma vez por ano, no Natal, e olhe lá!”. Hoje, ao contrário, Luciana diz que a vigilância é forte e constante, até mesmo entre os próprios membros da RENOME, que cooperam com a Secretaria Municipal de Abastecimento para garantir a higiene e a saúde do Mercadão sempre impecáveis.

O prédio “Treme-treme”, ao fundo, poderia resolver o problema do estacionamento.

Como Sérgio, Luciana também sentiu o peso dos anos sobre a força comercial do Mercado: em 1980, quando o pai atingia o pico das vendas, o açougue da família chegou a vender, em média, cem peças de porco por dia, fora as partes menos nobres do animal. Hoje, ela mostra uma vendagem de carnes bem menos admirável: cento e vinte peças em uma semana inteira de trabalho, das quatro da manhã às seis da tarde, seis dias por semana. Certamente, ela prefere a época na qual todas as lojas sob os arcos do Mercado eram feitas de mármore de Carrara. Antes da chegada dos supermercados.

“Os supermercados? Hoje em dia, a concorrência do supermercado é um problema sério”, ele diz. “A maior vantagem do supermercado é o estacionamento”, Luciana pensa, e explica que o espaço para carros permite aos compradores uma mobilidade muito mais cômoda que no Mercado Municipal. Exatamente como pensa Sérgio e a maioria dos comerciantes, para efeito de contagem. As alternativas criadas pelos vendedores para combater a concorrência feroz da economia de massa foi adotar o sistema de entregas a domicílio, que, mesmo com sua força, não dá conta de recuperar o fôlego dos velhos tempos.

Solução real? A construção de um estacionamento: “A gente já fez a proposta de derrubar o ‘Treme-treme’ aqui do lado [um prédio aos pedaços que permanece em pé, bem ao lado do Mercado], mas a prefeitura não deixa. Ela prometeu fazer uma passarela até o estacionamento do antigo prédio [da prefeitura, localizado na outra margem do Tietê], mas até agora não aconteceu nada”. A RENOME, diz ela, está totalmente nas mãos do governo para reformar o local.

Os corredores do Mercado ficarão mundialmente famosos pelo trabalho da prefeitura.

“O Mercado, mudou muito o público”, eles disseram, lembrando da época das vendas por atacado, coisa do passado. O turismo, dizem eles, tomou conta, e agora quase chega a ser comum ver mais gente falando inglês do que o povo paulistano em algumas épocas do ano. “O que vende mais hoje é a lanchonete, no segundo andar. A chefe aqui [Luciana], ela tem uma noção de porcentagem, disse que o açougue caiu mais de 70%”, Adelson explica.
Parando para falar com quem entende mais sobre o Mercado, a impressão que se tem é que, desde a fundação, o estabelecimento foi guiado por uma ordem: tradição. Entre as ruas e ruelas que ligam todas as lojas, o que fica no imaginário do visitante é que, mesmo em meio a tanta história, o gosto pela diversidade culinária encontra espaço para se renovar com o povo paulistano.
Certamente, com tantas histórias correndo pelas ruas do Mercado, setenta e cinco anos poderia parecer muito tempo, mas, andando pelos corredores e lojas diferentes, a impressão é a de que tudo está como deveria estar. Que os vendedores encontrem o caminho da renovação neste ano tão importante para o Mercado, e que mais alguém tenha a honra de escrever sobre os cento e cinqüenta anos do estabelecimento.

2 Comentários

Arquivado em Centro de São Paulo